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sábado, outubro 22, 2005  


Obstrução


Foi a primeira vez que escreveu seu nome na neve, sentindo o dedo queimar e se dessensibilizar. Tem experimentado borboletas em seu estômago, dia sim, dia não. Estamos fora de controle, percebeu? Com todas as armas, aquele arsenal disparando qualquer alarme por onde passávamos. Estávamos anestesiados. Foi preciso um holofote pra que saíssemos daquela negação estúpida e agora dá pra enxergar tudo porque a era da hipnose, ó, acabou.

Sintetizar é fácil, detalhar é fácil. Mas e dizer a verdade? Por via das dúvidas, queria ter escrito aquilo: não te dizer o que eu penso já é pensar em dizer. (As melhores idéias que já tive foram roubadas dos outros.) Mas é a única coisa que não cabe dentro do hiato. Porque sempre acaba da mesma forma: eu choro, você diz que me avisou.

Mas não te avisaram: não se perde pessoas, o que se perde é um ritmo sincrônico. Há muitos anos ouvi: o nosso tempo já passou. Foi um prego que perfurou a minha membrana timpânica e transfixou a base do crânio. Quando puxei de volta não drenou nada. Mas dói até hoje. Faço compressa de água quente quando o dia termina; só melhora quando acordo.

Acordei quase no final do filme. Quando ela diz pra ele: "pro seu pai só existiram duas mulheres no mundo:
a sua mãe
e todas as outras."

Me deu saudades, isso.
Dos tempos em que a gente amava em silêncio, de quando a neblina era bonita e tinha cheiro de camomila.
Agora, tudo na periferia. É preciso muito barulho e esgotamento para se provar qualquer coisa. Virei a pessoa mais fotofóbica que conheço.

Decidi aderir à greve de importâncias. Só porque o luto ficou justificável, logo agora que não sei mais combinar tons de preto entre si. Fiquei deitada, recebendo desapego intravenoso. Você não quis me transfundir o seu, arranjei quem quisesse. (A verdade, que lamentável, é que sempre vou me importar.)

Sobrou uma poça. De contradição e incerteza. Quem não é?
Vamos continuar sendo orgulho e desmatéria, uma sucessão de eventos duvidosos que parecem integralmente novos. Mas são os mesmos de sempre. Fazem a gente pensar: como a nossa vida é medíocre. Articular palavras vai continuar sendo uma prática obsoleta. Conformar-se: promessas são quebradas antes de serem feitas.
Ao menos não preciso interpretar mais nada. Despertar de um sonho ruim.
Ironia: descobri como se diz "decepção" em ortografia.

Tem coisas que todo mundo sabe: ler música, tirar sangue de artéria, escolher maracujá. Tem coisas que não se ensina.

Queria estar acessível, queria ser transmutável. Mas me desmascararam.
Escorri no vão.
Entre o trem e a plataforma.
Entre o que já foi e o que nunca mais.
   posted by Fernanda at 2:52 PM (imagens)

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