Bebel
Bruna
Coga

Francisco
Gabi
Gil
Joana
Ligia
Mari
Moca
Rabuja
Rosana





Arquivos





quinta-feira, abril 28, 2005  


Então, por favor,


Atraso. Mas meu relógio tinha enguiçado, parecia; tinha que ficar olhando as horas naqueles painéis de rua. Ou no visor do celular. Às vezes até no punho das outras pessoas, de relance, naquela discrição-inconveniente

O problema é que era um dia tão sozinho. E queria conversar sobre, não sei, futebol.

Entrei no ônibus procurando uma fisionomia mais ou menos familiar. Nada. Nem o moço, sempre o mesmo, que costumava se oferecer pra segurar minha mochila. Nem estava pesada. Mas eu tinha um medo danado de o estetoscópio partir. Escutar coração quebrado. Entrou um rapaz com uma pasta comprida. Algum trabalho lá dentro gritava assim "alguma coisa-design!" Pensei que talvez fosse alguém que eu (re)conhecesse. Mas não. Entrou um executivo com fone no ouvido. Fiquei achando bacana ouvir a distorção da música dos outros. Nem deu vontade de sentir saudades da minha. Escutei só as sílabas que faltavam pra arredondar a métrica. (Nunca consegui rimar tisne com cisne.) Tinha uma menina rosa, sentada, rosa sapato, rosa bolsa, rosa carteira. Acho que nunca tive alguma coisa assim, que fosse muito rosa. Mas me deu um desejo enorme de voltar pra casa, e descobrir se alguém tinha feito geléia de goiaba pra eu passar no croissant. Tem umas coisas que a gente só come quando é pequena. Depois, não sei. Parece que engorda.

Entrou um moço branco também, dos cabelos às barras da calça. Fui até ele perguntar se estetoscópio quebrava assim, sem mais nem menos. Reparei que ninguém cedeu o lugar pra que ele sentasse. Então achei melhor não apurrinhá-lo com bobagem. Me disseram que cidade grande é assim mesmo.

Queria uma superação. Não exatamente uma superação. Um exagero tampouco. Queria que tivesse uma palavra pra super-reações. Que nem em inglês.

De repente senti falta dos teus comentários meio cretinos. Por exemplo, eu. "Eu detesto quando as propagandas vêm com os verbos no imperativo. Detesto. Mas eu gosto de uma boa frase de efeito (quanta bobeira). Mas, enfim, qual é a diferença entre um slogan e um argumento?"
Sabe? Esse tipo de coisa que eu queria conversar. Além de futebol, é claro.

Foi quando começou a chover torrencialmente. Fui lá pra trás assistir todo mundo que saía do ônibus abrir o guarda-chuva muito afobadamente. Não era maldade. Ou era? Não era. Porque a minha vez estava chegando. Fiquei ensaiando tudo o que eu faria o resto do dia inteiro pra não perder o guarda-chuva. Que era do meu pai. Que tinha me levado numa sala quente e úmida na noite anterior. Que construíram agora há pouco, no meu prédio. E a melhor coisa é sauna, depois chuveiro gelado, depois sopa, depois banho frio. Depois abrir a janela pro vento e ficar sob as cobertas pro sono. Queria dizer pro rapaz designer: nossa, ontem morri de choque térmico. Mas ele tinha saltado já. Bem antes do que imaginei.

Não tem importância, penso em outra coisa. Olho o mar todo furado de chuva. As pessoas continuam correndo na ciclovia, uma meia-dúzia de gatos encharcados fica em baixo da pontinha da tenda dos quiosques. Todos com cara de espera. Só fui conseguir um lugar pra sentar no final de copacabana. E deu pra colocar uma música pra tocar. De dentro da mochila diretamente até os ouvidos. Assim não ia molhar.

Quando saltei, eu, o estetoscópio e o guarda-chuva do meu pai, descobri uma coisa importante: a tangerina tá na época. Fiquei lembrando do dia em que a gente comprou umas 8 ali, naquela feira mesmo, e ficou sem barriga pra almoçar. Ou com barriga demais.

Acho que o mundo é dividido entre as coisas que eu sempre quis e as coisas que eu ainda não sei que quero. Eu sempre quis dizer tudo de uma vez só.

Mas deixa, que eu dia eu conto. A tal história da minha vida.
   posted by Fernanda at 5:30 PM (imagens)

Comments:



Comments:


Powered by Blogger
Site Meter