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segunda-feira, dezembro 08, 2003  


Esboços

Nossas despedidas nunca chegaram a terminar. Ganharam autonomia. Agora estão todas vagando, ecoando pelos becos escuros que temos medo de freqüentar.

Seus dedos me deslizam pescoço e cabelos, de raízes a pontas. Me brincam os fios descuidados, esquecidos dentro de dias ocupados pelas coisas que não são visíveis. Você olha doce, fala veludo e abraça em perspectiva. Me deixa ali, tridimensionalmente perdida, buscando pontos de referência em quase-beijos milimetricamente improvisados.

Então eu tento expandir todas as minhas superfícies de contato pra diferenciar aquele momento dos outros todos. Tão iguais e tão singulares. Tento ser uma extensão da minha pele, retina e órgãos. Mas não consigo. Não sou capaz de ir além da minha própria matéria. Não sou capaz de ser alguma coisa que não apenas um corpo estático esperando que as forças externas incidam e determinem algum movimento. Ou alguma iminência.

As fotografias que você tirou de mim. O sabor que escolhi pra você. A garrafa de água que você saiu pra comprar. São personagens. Dos rascunhos de poesias em guardanapos e dos esboços desenhados com lápis de cera. São só palavras e só imagens graficamente representadas. Para apenas sintetizar o que já foi dissecado e analisado. Para deixar tudo isso registrado de uma forma esteticamente aceitável.

Talvez eles sejam mesmo os anjos inatingíveis que eu descrevi. Ou talvez eu seja essencialmente vulnerável a tudo o que me dizem – e a tudo o que deixam de me dizer. Mas você me olha com cuidado e só assim posso me desfolhar em alguém. Posso me separar em camadas sem ter que desmanchar depois. Tenho a garantia da reconstituição completa. Eu te pergunto se você quer sorvete. Você promete que não vai me deixar esquecer da lua.

Depois nos resta a porta semi-aberta. Você, eu, o corredor. Direções opostas. O inevitável crescendo, tomando proporções maiores que a sua arte, maiores que a minha música. Nosso hábito ainda não superou esse grau de angústia.

A porta se fecha dolorida e nossas despedidas desfalecem, tontas de tanto resistir ao próprio desgaste, à própria insanidade polivalente. Penduram-se em algum poste repleto de anúncios de mães-de-santo e depois caem sem forças. O meio-fio é o travesseiro.

Você me percorre de novo, dessa vez sem tato e sem olhos. Sem malabarismos e palavras transbordantes.
Apenas nossas presenças. Que se sabem iguais.
   posted by Fernanda at 11:10 AM (imagens)

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