É verdade: o concreto não me atrai. Talvez porque ele esteja exageradamente exposto por aí. O concreto está nas manhãs, dentro da minha xícara de porcelana, dissolvido no leite quente que inaugura o dia. O concreto está neste teclado. Através dele mando e-mails chorosos para amigos distantes. (Depois geralmente me arrependo: devo ser realmente uma chata.) Não vou dizer nada que me pareça absolutamente trivial; para isso servem os momentos verbais. Quero falar cada vez mais do recheio e menos do glacê. Aquela massaroca branca que todo mundo separa e deixa no cantinho do prato.
Escrevo para despejar mais as impressões, mais as sensações e menos os fatos. Os fatos não podem ser desgastados: são para o mundo real. São para os diálogos nos engarrafamentos, para os bares da vida, para os telefonemas saudosos. Para impressionar alguém ou simplesmente manter contato.
Não consigo mais publicar nada que não esteja suficientemente implícito, que não esteja carregado de toda a sensibilidade mal interpretada que as circunstâncias normais me impedem de dizer.